13/04/2009

09/12 - Aniv do Vi

Era de tardezinha e fazia muito calor quando o carteiro bateu palma no portão e me assustou. Eu estava concentrada em fazer montinhos com a terra que eu cavava, usando uma colher, no fundo do quintal. Em Itapetininga a terra é bem vermelha, uma delícia de fazer montinhos e se sujar. Gritei avisando a vó sobre a chegada do carteiro enquanto corria até o portão.
Uma carta! Como na tv! Eu estava recebendo uma correspondência e o melhor: agora eu sabia ler!

Peguei o telegrama e entrei pela porta da cozinha, perto do pé de chuchu. O Max veio correndo atrás de mim. A vó abria o telegrama enquanto meu coração acelerado parecia que ía sair pela boca se eu não conhecesse logo o conteúdo do envelope. Ela leu que o neném havia nascido.
O neném da minha mãe? Já nasceu? Parecia mágico tudo aquilo do neném estar na barriga e nascer. Agora ele poderia ser visto! Fiquei tão ansiosamentecontenteconfusaecuriosa, tudo junto, tudo agora, que tomei o telegrama das mãos da vó e li.

Lembro-me de entrar no ônibus, um Cometa daqueles antigos que têm um cheiro forte que vem das poltronas marrons. Coloquei um biscoito de polvilho em cada dedo, como se fossem anéis e então os comi. Não me lembro da rodoviária de Itapetininga mas me lembro da de Tatuí. Também não me lembro de como fomos da rodoviária de São Paulo até em casa, mas me lembro de estarmos lá, esperando meu pai sair do banho pra que fossemos logo ver o neném.
O hospital era lindo. Tinha uns vitrais e um corredor extenso, com portas dos dois lados. Arranjos artesanais com temas infantis enfeitavam as portas. Meu pai pediu para que eu adivinhasse qual era o nosso e, entre tantas portas e tantos enfeites, eu corri até uma porta com uma pipa azul de rabiola comprida toda de cetim. Eu sabia que era alí. E era mesmo.
Entrei e beijei minha mãe, que estava na cama de camisola. Não sei em que momento entrou a enfermeira com o neném no colo. Ele era lindo! Tão pequeno que parecia de mentira. Minha avó o pegou no colo e disse que era um menino lindo. Eu embaixo pulando, querendo, pedindo. Ela me deu. Ajeitou o neném no meu colo e disse pra que tomasse cuidado com a cabeça dele.
Ele estava cheiroso. Abriu os olhinhos e olhou pra mim. Que brilho, que intensos! Os olhos eram grandes e pareciam assustados. Pareciam procurar alguma coisa em mim enquanto os meus se enchiam de lágrimas. Os olhos dele procuraram mas eu senti que não encontraram. Me deu uma sensação ruim, eu queria que ele encontrasse em mim!
Ele começou a mexer as mãozinhas e eu pedi pra que alguém o pegasse porque ele ía chorar. Ele chorou e os olhos fugiram dos meus. Já pesava nos meus braços quando a vó o tirou do meu colo, mas eu queria mais.
Ele foi pro colo de não sei quem e eu fiquei. Fiquei com um negócio forte, um sentimento sem nome. Fiquei lembrando de cada instante de tudo aquilo que acabara de acontecer. Contando assim parece que foi muito tempo, mas na verdade não foi mais do que um minuto. Um minuto eterno.

(Publicado em 09/12/08 no blog antigo)


2 comentários:

  1. Romanauskas.Tudo bem Nathália ? Hà(tem crase?)muito tempo não lia o seu blog. Você saiu do Multiply e eu, não tinha o atalho. Lembrei do To Romanauskas. Eu digito isso e, no meio de alguns parentes, aparece o seu blog. Hoje, andei lendo. Tem alguns comentários de anônimos. Não sou eu. Sentí falta de coisas muito bonitas, que você escrevia. Um exemplo disso, é essa página aí em cima. ISSO É LINDO !Abraços em você, na Rita e na Jô.

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  2. Muito agradecida!!!
    Continue acompanhando.

    bjs!

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